Durante anos, os cookies de terceiros foram a base da análise de marketing digital. No entanto, mudanças recentes na legislação, como o reforço do RGPD e restrições dos principais navegadores — lideradas pelo Chrome da Google e o Safari da Apple — estão a transformar esse cenário. Em junho de 2025, os profissionais de marketing são obrigados a repensar como acompanham, atribuem e personalizam as jornadas dos utilizadores. A transição não é apenas técnica — é estratégica, exigindo uma reavaliação do papel da confiança, da transparência e da dependência de dados primários.
Desde meados de 2025, o Chrome já eliminou os cookies de terceiros para a maioria dos utilizadores, seguindo os passos do Safari e do Firefox. Isso significa que os profissionais de marketing já não podem contar com scripts externos para rastrear o comportamento entre sites. Muitos métodos tradicionais de rastreamento tornaram-se obsoletos, afetando significativamente o retargeting, o acompanhamento de conversões e a atribuição cruzada.
As notificações de consentimento deixaram de ser suficientes para evitar o escrutínio regulatório. Os utilizadores exigem hoje controlo real sobre os seus dados, e as autoridades reguladoras estão cada vez mais atentas. O perfil comportamental baseado em cookies está a ser substituído por alternativas baseadas em consentimento e minimização de dados.
Esse novo paradigma exige que as empresas adotem estratégias baseadas em dados próprios e ferramentas de medição que preservem a privacidade, como o Privacy Sandbox da Google ou o SKAdNetwork da Apple. As marcas que não se adaptarem correm o risco de perder acesso a análises fiáveis e, consequentemente, a sua vantagem competitiva.
Sem cookies de terceiros, modelos tradicionais de atribuição como o last-click deixaram de ser confiáveis. É necessário implementar estruturas novas que considerem jornadas de utilizador fragmentadas e anónimas. Até a atribuição multi-toque enfrenta desafios devido à redução da granularidade dos dados.
A recolha de dados primários torna-se essencial — desde subscrições por e-mail e métricas de uso de apps até registos integrados ao CRM. Garantir que estes dados sejam obtidos de forma ética e armazenados em segurança é agora uma obrigação legal sob o RGPD e as diretivas ePrivacy.
O rastreamento server-side está a ganhar destaque como solução para mitigar perdas de dados em navegadores. Ao processar eventos nos próprios servidores, as empresas mantêm o controlo dos fluxos de dados, respeitando simultaneamente as expectativas de privacidade dos utilizadores.
A análise num mundo sem cookies exige uma redefinição completa dos KPIs. Os profissionais de marketing devem focar-se em métricas de envolvimento, valor vitalício do cliente e eventos de conversão mensuráveis por interações diretas com dados próprios.
Ao invés de rastrear utilizadores individualmente, os dados agregados e as informações baseadas em coortes tornam-se o novo padrão. Por exemplo, a API Topics da Google permite segmentação baseada em interesses gerais sem rastrear indivíduos.
Ambientes de dados isolados (“clean rooms”) também são uma opção relevante — espaços seguros onde dados de diferentes origens podem ser combinados sem expor identificadores pessoais. São particularmente úteis em parcerias entre anunciantes e editores.
Com a redução dos dados comportamentais detalhados, a inteligência artificial e o machine learning preenchem essa lacuna. Modelos preditivos conseguem estimar taxas de conversão ou churn sem recorrer a rastreamento intrusivo.
Empresas também estão a investir em conjuntos de dados sintéticos para simular interações de utilizador e testar campanhas. Quando validados, esses modelos oferecem uma alternativa segura e compatível com a privacidade.
Além disso, a IA melhora a segmentação ao analisar dados próprios para formar grupos semelhantes ou agrupamentos por interesse. Isso permite um planeamento de campanhas à escala sem comprometer a confidencialidade.
A mudança para um cenário sem cookies representa uma transformação maior — de um marketing baseado em vigilância para um marketing baseado em confiança. Os utilizadores estão mais conscientes, os reguladores mais exigentes e a ética é agora um diferencial de marca.
A transparência no uso de dados deve ser comunicada de forma proativa. As marcas precisam explicar claramente quais dados recolhem, com que finalidade e como isso beneficia o utilizador. Isso fortalece a confiança e a lealdade do público.
As plataformas de gestão de consentimento (CMPs) devem ser integradas de maneira fluida na jornada do utilizador, sem padrões enganosos. Respeitar a privacidade é hoje um fator determinante para o sucesso da marca.
Audite o stack atual de rastreamento e elimine ferramentas dependentes de cookies de terceiros. Invista em infraestrutura de dados próprios, como CDPs (Customer Data Platforms), para garantir crescimento sustentável.
A colaboração entre equipas de marketing, jurídico e dados é essencial para construir sistemas analíticos confiáveis e em conformidade. Isso não só garante sobrevivência, como também promove inovação.
Por fim, mude o foco de rastrear utilizadores para compreendê-los por meio de interações valiosas. O marketing ético não é uma limitação — é o alicerce para um crescimento duradouro e centrado nas pessoas.